domingo, 30 de abril de 2017

REFLEXÕES PARA UM JUDAÍSMO SECULAR PARA O SÉCULO XXI

Outubro 2006
Como judeu que se define Secular Humanista, gostaria neste pequeno memorando de compartilhar com o leitor duas importantes reflexões sobre O que vem a ser Judeu Secular Humanista no Século 21 e a centralidade de Deus e do Homem.
O Judaísmo Secular Humanista vem se convertendo, nos últimos 40 anos, não só em um pensamento filosófico, mais sim em um movimento organizado, ou melhor, em uma nova e atuante corrente do judaísmo do século XXI.
Desde meados da década de 1960, surgiram 14 comunidades filiadas ao Jewish Secular Humanistic Community (Comunidade do Judaísmo Secular Humanista), principalmente nos Estados Unidos e em Israel, mas também na Europa, Austrália, México e Uruguai. Tais Comunidades têm como base a influência de personalidades e lideres como o Rabino Mordechai Kaplan, fundador do movimento judaísta reconstrucionista nos EUA e o Rabino Sherwin Wine (fundador do movimento Judaísmo Humanista também nos EUA e em Israel); podemos citar ainda, entre os mais influentes, Yair Saban, fundador do movimento Meitar, que vê o judaísmo como cultura. Saban é ex-ministro de Israel pelo antigo partido socialista Mapam.
O que essas três grandes personalidades, Kaplan, Wine e Saban, têm em comum é a centralidade do Homem no mundo; em suas comunidades judaicas, eles talvez expliquem tais conceitos através de diferentes ângulos, mas mantêm sempre a mesma base do Homem como centro.
Mas o que levou o pensamento filosófico do Judaísmo Secular Humanista a se organizar em comunidades estruturadas no século 21?
Uma resposta a essa pergunta deve levar em consideração isto: o que vem a ser Judeu no Século 21, na era da Globalização?
Se Napoleão vivesse hoje, em plena Revolução Global, logicamente não faria aos 71 senedrim (lideres religiosos) as 12 perguntas que fez na França de 1807. Talvez fizesse apenas uma: Quem é judeu?
E obteria inúmeras respostas, todas diferentes e corretas. Napoleão provavelmente sairia insatisfeito desse encontro; sua grande dificuldade, em pleno século 21, seria definir a quem fazer tal pergunta, uma vez que temos, hoje, um judaísmo de tantos tipos de senedrim diferentes.

Judaísmo é, hoje, uma fusão de identidades mundiais; não existe mais uma identidade judaica única, somos judeus de identidades diversificadas, de valores e conceitos que mudam num ritmo acelerado. As identidades no Judaísmo deste século recriam-se, renascem, revitalizam-se em um novo e versátil judaísmo de "caras novas", onde as correntes clássicas desse judaísmo se transformam para sobreviver e se adaptam ao novo padrão das identidades globalizadas.
O Judaísmo Secular Humanista faz parte integral desse processo, ele está tomando um novo ritmo, criará um novo rumo na vida judaica.
O que se chamou de pensamento Judaico Secular Humanista no passado foi, sem dúvida, o resultado de um processo de 200 anos de emancipação, tem origem na revelação de Copérnico sobre a terra não ser mais o centro do universo; esse judaísmo assumiu a coragem de Darwin ao afirmar que o homem não é mais filho de Deus; esse judaísmo sentou-se no divã de Freud quando se identificou com a revelação de que o homem é um labirinto povoado pelo inconsciente; esse Judaísmo Secular Humanista é fruto do pensamento de Spinoza, Mendelssohn, Hess, Marx, Buber, Sartre, Theodor Hertzl e muitos outros.
Quem desejar se definir como um judeu secular humanista do século 21 terá de enfrentar grandes desafios – não na necessidade de reafirmar o pensamento "O homem como centro do mundo, ou da vida judaica", mas na reconstrução dos fundamentos do pensamento judaico secular humanista, dentro da compreensão de que o judaísmo é uma civilização.
Compreender isso não é o suficiente. É preciso, ainda, saber se unir e atuar como judeus seculares humanistas. E para isso é necessária a organização em estruturas comunitárias voluntárias e ativas, como as que vêm surgindo nos últimos anos em sociedades judaicas em diversas partes do mundo.
Quem crê em um Judaísmo Secular Humanista precisa conhecer e agir de acordo com preceitos judaicos. Essa prática deverá estar presente em toda a esfera da vida da comunidade, nos aspectos cultural, histórico e educativo, realizando o ciclo da vida judaica através do Brit Milá, de casamentos, Bar Mitzva e Bat Mitzva, entre outras festividades judaicas.
Para que o leitor possa compreender melhor a prática desses conceitos, seguem algumas idéias já integradas e definidas em comunidades judaicas seculares humanistas:
· O Judaísmo Secular Humanista para o século 21 deverá restabelecer de forma clara o direito do povo judeu a seu centro civilizatório, que é a terra de Israel. Deverá lutar contra o racismo, o anti-semitismo e o fundamentalismo religioso; deverá restaurar a vida e a cultura judaica através da educação, fortalecendo o núcleo comunitário e o movimento juvenil.
· A educação judaica secular humanista não somente depende da compreensão seus rituais, mas também deve capacitar os seus indivíduos para uma amplitude cultural judaica voltada ao pensamento critico e analítico, para a formação de lideranças capacitadas a enfrentar as possíveis manifestações de antagonismo e hostilidade ao mundo externo.
· A expressão de civilização judaica tem como base de estudo de texto judaico a interpretação das expressões de nossos antepassados e relacionando-as ao pensamento moderno, condicionando-as e interpretando-as de maneira relevante dentro do contexto da sociedade pós-moderna.
Devem ser incentivadas as manifestações culturais e artísticas como forma de criar um espaço comunitário atrativo, absorvendo, assim, judeus afastados do judaísmo. O Judaísmo Secular Humanista acredita que judeu é todo aquele que se identifica como judeu e está vinculado de forma ativa a sua historia, cultura e tradições.
Com tudo isso, onde fica Deus dentro dessa visão de Judaísmo Secular Humanista?
Deus existe ou não?
Se fizéssemos esta pergunta, “Deus existe ou não?”, para Kaplan, Wine ou Saban, eles nos dariam três respostas diferentes – porém, é incerto qual deles poderia responder essa grande pergunta com mais segurança e firmeza. A verdade, pode-se dizer, é que muitos judeus seculares humanistas concordariam que "Sim, Deus existe – em nossas consciências. Ele é um, mas não é o centro deste mundo; o homem é o centro".
Para explicar melhor essa afirmação, temos que voltar às fontes de uma passagem bíblica em Êxodos, que talvez seja uma das mais importantes para os judeus humanistas; ela nos revela algo interessante sobre a questão da centralidade de Deus e do Homem. Essa passagem revela o diálogo sem fronteiras entre Moisés e Deus.
Conta-se em Êxodos que Deus manteve um diálogo profundo com o profeta Moisés, em que revelou, inclusive, um de seus vários nomes. O Profeta Moisés talvez teve que transcender os conceitos de tempo e de espaço para poder chegar mais perto desse Deus.
Esse Deus anuncia um dos mais importantes eventos da humanidade, a todos os seres humanos representados, ali, pelo Profeta Moisés, na entrega das Tábuas das Leis; Tábuas que devem estabelecer o pacto profundo entre Deus e o Homem. Esse pacto, escrito em pedra fundida, é denominado Os Dez Mandamentos.
Mas que Leis são essas? Para quê Deus nos apresenta essas Leis? Talvez Deus tivesse a intenção de nos dizer que os Dez Mandamentos eram o código moral e ético que deveria reger todos os seres humanos que vivem na face da Terra, e, como judeus, deveríamos divulgar esses mandamentos a toda humanidade.
Talvez o nosso Profeta Moisés, nesse dialogo tão humano, ainda tenha tido a coragem de perguntar a Deus: "E agora, Deus? O que vai acontecer? Para onde Vamos?” E talvez esse Deus tenha respondido: "A partir de agora, vocês, seres humanos, serão o centro da terra. Vocês têm um código moral e ético a ser cumprido, portanto, se virem! Eu irei para outros cantos, eu estarei em outros tempos celestiais".
O Judaísmo Secular Humanista procura "se virar", assumindo responsabilidades, neste mundo conturbado em que vivemos. Já se passaram mais de 4 mil anos e as metas de moral e da ética das Tabuas das Leis ainda estão muito longe de ser alcançadas,. E essa é, talvez, a grande missão do Judaísmo Secular Humanista; responsabilidade que deve ser assumida por nós, seres humanos, aqui na Terra, e não entregue a Deus.


O filósofo humanista Kenneth Phife define sua visão de Deus de forma muito interessante:
"O humanismo nos ensina que é imoral esperar que Deus aja por nós. Devemos agir para acabar com as guerras, os crimes e a brutalidade desta e das futuras eras. Temos poderes notáveis. Termos um alto grau de liberdade para escolher o que havemos de fazer. O humanismo nos diz que, não importa qual seja a nossa filosofia a respeito do universo, a responsabilidade pelo tipo de mundo em que vivemos, em última análise, cabe a nós mesmos."
Se a responsabilidade sobre o mundo e os seres humanos cabe a nós e não mais a Deus, de que forma podemos assumi-la?
O Judaísmo Secular Humanista deve assumir o legado recebido pelo Profeta Moisés no alto do Monte Sinai. Devemos fazer de cada uma dessas comunidades a consciência da memória do Legado da Ética e da Moral recebido no Monte Sinai. Devemos nos responsabilizar e garantir que esse Legado seja difundido para todo mundo, com o intuito de alcançarmos um mundo melhor e mais humano.

Jayme Fucs-Bar

sábado, 29 de abril de 2017

JUDAÍSMO HUMANISTA: ENTREVISTA COM JAYME FUCS BAR POR DENISE WASSERMAN

29/07/2010
Identidade
O Judaísmo Secular Humanista é uma corrente dentro do judaísmo que vem reunindo progressistas e intelectuais em várias partes do mundo. Mais do que um pensamento filosófico, é um movimento organizado e atuante que nasceu na década de 1960 e tem a sua maior expressão nos Estados Unidos e em Israel. Mas também na Europa, Austrália, México e Uruguai, o Judaísmo Humanista tem como base a influência de personalidades e líderes, como o Rabino Mordechai Kaplan, fundador do movimento judaísta reconstrucionista nos EUA e o Rabino Sherwin Wine (fundador do movimento Judaísmo Humanista também nos EUA e em Israel).
Para conhecer melhor esta linha de pensamento, entrevistamos o brasileiro Jayme Fucs Bar, que mora em Israel há 28 anos e é o coordenador do site Judaísmo Humanista que congrega hoje 412 membros. Vamos lá?
. Você é o coordenador do site Judaísmo Humanista. Quando começou a seguir por essa linha, e qual é o seu papel dentro desta comunidade?
– A minha formação judaica vem da comunidade do Rio de Janeiro e, como muitos de minha geração, tivemos uma vivência judaica secular, porém o encontro com uma visão judaica humanista aconteceu no Colégio Scholem Aleichem, no Hashomer Hatzair e mais tarde no Kibutz Nachshon, no qual vivo desde 1982.
. Quando e onde surgiu o movimento dos judeus humanistas?
– O Movimento do Judaísmo Humanista organizado tem suas origens no Movimento Kibutziano, no Bundismo (movimento de um grupo de judeus na Rússia revolucionária, que tentou oficializar na Segunda Internacional Comunista seu direito de manter a identidade étnica), e também na ação de Sherwin Wine, um rabino Reformista, que deixou o Movimento Reformista, pois concluiu que o judaísmo era muito mais que uma religião. Vivo num Kibutz em Israel, como muitos outros Kibutzim. Celebramos todo o ciclo de vida judaico e todas as festividades de forma não religiosa. Compartilhamos em nossos festejos de um ritual dentro dos aspectos culturais e da tradição judaica e, sobretudo, com um grande compromisso ético e moral da Torá, que nos ensina o respeito profundo à vida e ao ser humano.
. O que este movimento se diferencia, na prática, do judaísmo ortodoxo?
– Para mim, o perfil básico que faz a grande diferença em relação a outras correntes é a definição de que judeu é todo aquele que se define como parte integral da história, cultura e tradição judaica, independentemente dos dogmas exigidos pelas correntes religiosas, que definem que para ser judeu é preciso ser filho de mãe judia. Ser judeu está totalmente relacionado com uma identidade cultural judaica, e uma relação profunda com a história e tradição milenar do povo judeu. Estou ciente que esse tema está impregnado de um grande dogma entre as comunidades judaicas do Brasil e do mundo. Mas é preciso falar, debater e não ter medo de enfrentar e romper com esse dogma, pois de fato existem fora da vida comunitária milhares de judeus que foram criados, educados e se identificam com a parte integral de nosso povo, porém, estão marginalizados e excluídos. Essa situação é cada vez mais grave dentro do mundo judaico atual, onde o judaísmo organizado se torna cada vez mais uma opção religiosa, onde existem milhares de famílias que institucionalmente “perdem” sua condição judaica, surgindo uma necessidade vital de criar e se congregar em comunidades seculares humanistas, que proporcionam a esses judeus uma nova opção de continuidade judaica organizada.
. Como o judaísmo humanista é visto em Israel?
-A questão das correntes judaicas em Israel é muito mais complicada que nas comunidades judaica no mundo. Primeiro porque não existe separação entre Estado e Religião em Israel. A outra é que o sistema parlamentar de Israel não proporciona aos partidos de maioria laica governar sem a minoria religiosa ortodoxa, e o mais trágico dessa realidade é que grande parte dessa ortodoxia não é sionista e não se alista ao exército, porém controla o poder e o monopólio do judaísmo.
Existem hoje em Israel cerca de 120 mil pessoas que têm o direito à lei do retorno, defendem o país, porém não são reconhecidos como judeus pela ortodoxia, isso quer dizer, podem morrer por Israel em suas batalhas e em suas guerras, mas não podem ser enterrados como judeus e muito menos casar em Israel. O Judaísmo Humanista em Israel tem como agenda na Knesset e na sociedade Israelense a luta pela separação do Estado da Religião e o direito a todas correntes judaicas de serem legitimadas.
. Existem rabinos ou sinagogas na linha humanista?
-Existe um processo novo na sociedade israelense de criação de Beit Midrash seculares humanistas, como resposta ao processo de ortodoxia da sociedade israelense. Existem hoje dezenas de Instituições desse tipo, como: Bina, Meitar, Alma. Uma delas, na qual participo e estudo, é o Centro Tmura de Jerusalém que formam Rabanim Seculares Humanistas.
. Como o judaísmo humanista é visto pelos mais religiosos?
-Acho que todas as correntes judaicas são legitimas e têm o seu lugar dentro da vida das comunidades, porém essas ideias do judaísmo secular humanista organizado que propõem uma alternativa compatível a muitos judeus do século XXI , vêm sendo criticadas por grupos religiosos e tradicionalistas, e eu como judeu secular humanista exijo o meu legítimo direito de me congregar e me definir como uma corrente judaica legítima, que tenha seus próprios rabanim,shilichm tziburiim, batei midrash, centros culturais etc, realizando todos os serviços judaicos como Kabalat Shabat,Brit Milá, Bar –Bat Mitzvah,casamento, festejos judaicos, conversão, sepultamento, enfim, o ciclo da vida judaica completo.
. Em que país (fora Israel) o judaísmo humanista é mais forte?
-Com referência à vida comunitária, sem dúvida, é nos EUA, onde os processos judaicos comunitários acontecem. Devemos prestar atenção como o judaísmo americano vem aos poucos recriando o judaísmo, como resposta aos novos dilemas judaicos numa sociedade pós-moderna e globalizada. Vale a pena acompanhar esse magnífico processo de renovação judaica criado pelo movimento reconstrucionista do Rav Modechay Kaplan e do movimento Humanista do rav Sherwin Wine.Venho aprendendo muito com essas comunidades nos EUA.
. Qual é a relação do judeu humanista com o Sionismo?
– O meu Judaísmo Humanista é também inseparável do compromisso com o destino do Estado Judeu. Acredito que o Judaísmo Secular Humanista deverá ser uma manifestação moderna de um Sionismo renovador e progressista, que deverá cumprir, na prática, a carta magna da independência do Estado Judeu de almejar um Estado dos sonhos dos profetas de Israel. Um Estado judeu baseado na paz e no respeito mútuo entre os povos, e na justiça e solidariedade para todos os seus cidadãos. O Judaísmo Humanista deverá ter hoje mais do que nunca, um papel político claro e critico sob os rumos atuais do Estado Judeu. Isso quer dizer: não abrir mão de reivindicar pela necessidade da separação entre Estado e Religião, e o direito de todas as correntes judaicas à legitimidade institucional; não ter medo de lutar pelo reconhecimento mútuo ao direito legítimo do Estado Judeu e do Estado Palestino de viverem um ao lado do outro com fronteiras reconhecidas e seguras.
. Fale sobre o site Judaísmo Humanista ( http://judaismohumanista.ning.com/ )
– O site foi criado em junho de 2009. Surgiu da necessidade de termos um espaço judaico mesmo que no virtual, para que as pessoas possam se manifestar, estudar, refletir e questionar sobre o tema Judaísmo Secular humanista. A repercussão desse site foi mais do que esperada, temos, até o momento, 412 membros e média de 1300 pessoas nos visitando por mês, inclusive realizaremos em breve um encontro desse grupo no Rio de Janeiro e em São Paulo. O Judaísmo humanista é um grande desafio do judaísmo pós- moderno e o crescimento ou não desse movimento na atualidade dependerá somente de cada um de nós, judeus seculares humanistas, nas nossas possibilidades de sairmos do conformismo e do individualismo e assumir na prática a responsabilidade de se organizar e criar nossas próprias keilot, dando respostas diretas para nossas necessidades como judeus seculares e, principalmente, uma opção real para um judaísmo de roupas novas que possa encarar o século XXI com fé (EMUNAH) no ser humano.
Artigo originalmente publicado no Nosso Jornal (RJ) e no blog Judaísmo Humanista.

quinta-feira, 27 de abril de 2017

ANI YEHUDI


A IDÉIA DE DEUS

O físico alemão Albert Einstein que, entre seus principais trabalhos desenvolveu a teoria da relatividade, escreveu interessante depoimento, que merece ser lido, ouvido e meditado:
A opinião comum de que sou ateu repousa sobre grave erro. Quem a pretende deduzir de minhas teorias científicas não as entendeu.
Creio em um Deus pessoal e posso dizer que, nunca, em minha vida, cedi a uma ideologia ateia.
Não há oposição entre a ciência e a religião. Apenas há cientistas atrasados, que professam ideias que datam de 1880.
Aos dezoito anos, eu já considerava as teorias sobre o evolucionismo mecanicista e casualista como irremediavelmente antiquadas.
No interior do átomo não reinam a harmonia e a regularidade que esses cientistas costumam pressupor.
Nele se depreendem apenas leis prováveis, formuladas na base de estatísticas reformáveis.
Ora, essa indeterminação, no plano da matéria, abre lugar à intervenção de uma causa, que produza o equilíbrio e a harmonia dessas reações dessemelhantes e contraditórias da matéria.
Há, porém, várias maneiras de se representar Deus.
Alguns O representam como o Deus mecânico, que intervém no mundo para modificar as leis da natureza e o curso dos acontecimentos.
Desejam colocá-lO ao seu serviço, por meio de fórmulas mágicas.
É o Deus de certos primitivos, antigos ou modernos. Outros O representam como o Deus jurídico, legislador e agente policial da moralidade, que impõe o medo e estabelece distâncias.
Outros, enfim, o entendem como o Deus interior, que dirige por dentro todas as coisas e que se revela aos homens no mais íntimo da consciência.
A mais bela e profunda emoção que se pode experimentar é a sensação do místico.
Este é o semeador da verdadeira ciência.
Aquele a quem seja estranha tal sensação, aquele que não mais possa sonhar e ser empolgado pelo encantamento, não passa, em verdade, de um morto.
Saber que realmente existe aquilo que é impenetrável a nós, e que se manifesta como a mais alta das sabedorias; a mais radiosa das belezas, que as nossas faculdades embotadas só podem entender em suas formas mais primitivas.
Esse conhecimento, esse sentimento, está no centro mesmo da verdadeira religiosidade.
A experiência cósmica religiosa é a mais forte e a mais nobre fonte de pesquisa científica.
Minha religião consiste em humilde admiração do espírito superior e ilimitado que se revela nos menores detalhes que podemos perceber em nossos espíritos frágeis e incertos.
Essa convicção, profundamente emocional, na presença de um poder racionalmente superior, que se revela no incompreensível, é a ideia que faço de Deus.
*   *   *
Quando o homem se detém a contemplar o fulgor das estrelas no firmamento, constata a grandeza da Criação.
Sente emocionado a presença da Divindade a se refletir em cada astro, em pleno universo.
E constata que, sem o amor de Deus que tudo vitaliza, a Criação voltaria ao caos do princípio.